Onde nascem os vinhos no Chile


Das minhas andanças pelos vales de plantações de uvas, principalmente acompanhando turistas, brotou em mim a vontade de escrever e tentar descrever onde nascem os vinhos no Chile, de norte a sul do país e nas quatro estações do ano. Mostrar como são as plantações carregadas de uvas ou só com os galhos secos. Os períodos de vendimia e elaboração dos vinhos. Mostrar que as parreiras se adaptam bem no calor da Região Central e no frescor do alto das montanhas lá no norte do Atacama. Que elas gostam da brisa do litoral e sobrevivem ao frio cortante das geleiras da região Austral.

Confesso que eu ainda não conheço pessoalmente todas essas regiões. O Chile é um país com um território pequeno – pouco mais de 700.000 km² – mas com tantas belezas naturais que eu ainda preciso de mais alguns anos para percorrer tudo, ou ao menos a grande parte das suas maravilhas. Então, para não me demorar mais em escrever, me aproveitei de um presente que ganhei: um livro que descreve o Chile lindamente. Um livro que fala dos vales de plantações, das variedades, das vinhas e do seu povo apaixonado pelo que faz, desde os tempos remotos da colonização espanhola. Percorri, através das suas páginas, os lugares que eu ainda não pisei com os meus pés, para assim poder dividir com vocês as maravilhas de onde nascem os vinhos chilenos. Os vinhos que tanto amamos!

Vamos lá… Você já buscou o Chile no mapa? Ele parece submergir das águas! Seu território é um tanto peculiar [dá uma olhadinha no mapa ao lado] e tem a forma de uma pimenta: 4.300 quilômetros de extensão por apenas 175 quilômetros de largura. Cercado por quatro barreiras naturais: de leste a oeste ele está acomodado entre as montanhas da Cordilheira dos Andes e o oceano Pacífico. Ao norte, a sua barreira é o deserto do Atacama, e ao sul, as geleiras da Patagônia. E ele ainda se equilibra acima de duas placas tectônicas. É mesmo um país de belezas extremas.

Existe uma faixa imaginária no planeta batizada de a franja do vinho: um grande e fértil pedaço de terra onde as parreiras crescem em condições excepcionais. No Chile, as regiões do Atacama, Coquimbo, Aconcagua, Vale Central, Região Sul e Região Austral fazem parte dessa franja, e é onde estão concentradas as vinhas e as plantações de uvas. Essas seis grandes regiões têm características únicas de solo e clima, com zonas beneficiadas por brisas frias que baixam das montanhas da Cordilheira ou que chegam do oceano Pacífico, refrescando a terra. Outras zonas são regadas com as águas vindas da Cordilheira.

O Chile tem uma geografia única e rica em relevos: montanhas com mais de 5 mil metros de altitude, vulcões ativos, rios caudalosos e um solo extremamente fértil, rico em cobre e outros minerais. O seu clima é mediterrâneo, com chuvas principalmente no inverno e que coincidem com o descanso vegetativo das parreiras, e um período mais seco e quente que coincide com o crescimento e amadurecimento das uvas. De Cordilheira a mar, o Chile tem condições extremamente favoráveis para a viticultura, com uma generosa diversidade de microclimas e solos que permitem o cultivo de uma grande variedade de uvas.

De norte a sul, o Chile está dividido oficialmente em seis grandes regiões de plantações,  somando um total de 140.000 hectares de uvas para vinho. Essas regiões estão fracionadas em dezessete vales que definem a Denominação de Origem dos vinhos, estampada em seus rótulos. E tem as indicações geográficas: Andes, Entre Cordilheiras e Costa, também exibidas nos rótulos e que definem a principal influência climática que eles receberam.

Os apreciados e prestigiados vinhos da uva cabernet sauvignon nascem no caloroso vale de Maipo – o vale mais urbano de Santiago, onde algumas vinhas resistem ao crescimento e ao agito da cidade. As primeiras variedades finas francesas foram plantadas e as mais antigas e tradicionais vinhas foram construídas nas ribeiras do rio Maipo. Em direção ao litoral e a caminho de Valparaíso, as montanhas da Cordilheira da Costa são mais baixas, e logo que entramos no jovem vale de Casablanca notamos uma mudança de clima e paisagem. Dos dois lados da estrada avistamos as vinhas e as suas intermináveis plantações de chardonnay, pinot noir e sauvignon blanc, entre outras uvas que se adaptam melhor ao clima mais fresco e úmido do vale.

No sentido sul de Santiago, estão os belíssimos vales de Cachapoal e Colchagua, de onde nascem os notáveis vinhos da uva carmernère. E ainda mais ao sul estão os vales de Curicó e Maule [a maior região produtora de uvas do Chile e onde estão plantadas algumas das parreiras mais antigas das uvas país e moscatel]. Vales onde a tradição campesina se mantém, e onde a produção de vinhos patrimoniais e naturais vem sendo resgatada.

Além das seis regiões oficiais, existem também plantações de uvas em algumas zonas extremas do país [sem Denominação de Origem]. Zonas onde a forma tradicional de se elaborar vinhos se mantém desde a chegada das primeiras uvas, ainda no século XVI com os colonizadores espanhóis. Um desses exemplos é a elaboração do vinho doce Pintatani, que mostra o quanto a arte de produzir vinhos no Chile é antiga. No norte do país, próximo ao Salar do Atacama e acima dos 2.400 metros de altitude, tem plantações de antigas parreiras das uvas país e moscatel, usadas para a elaboração de um vinho doce e de origem ancestral, chamado Criollo. O Projeto Ayllu [que na língua dos atacamenhos significa comunidade] e o trabalho em conjunto de um pequeno grupo de produtores dão vida a vinhos doces e secos das uvas syrah e malbec. Ao sul, na inóspita e lindíssima Patagônia, alguns projetos experimentais estão ganhando espaço, um desses projetos é realizado pela vinha Undurraga, com plantações da uva pinot noir.

A natureza privilegiada do Chile, a tecnologia, a criatividade, a persistência e a imensa paixão dos vinhateiros chilenos [além dos espanhóis, franceses, croatas, brasileiros e outros apaixonados que escolheram o Chile para fazer as suas joias] são os ingredientes de uma receita perfeita para a elaboração de vinhos com diferentes cores, sabores e aromas, e que representam a cultura e a essência de cada lugar.

Bem, acho que você já tem alguns bons motivos para incluir no seu roteiro a visita a pelo menos um vale de plantações aqui no Chile. Provar dos seus vinhos e da sua culinária, conhecer o seu entorno, os seus atrativos e a sua gente.

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